Por que será que as descidas normalmente são muito mais desejadas do que as subidas? Uma resposta óbvia seria: a lei do menor esforço; ou seja, descer é sempre muito mais fácil e demanda menos esforço do que subir. Mas, há também uma outra explicação para a fascinação que a descida exerce sobre o ser humano: o prazer provocado pela sensação de “vento na cara” (isto tem a ver com velocidade, com precipitação, com ‘injeção’ de adrenalina na corrente sanguínea).
Lembro-me de muitas brincadeiras da minha infância, passada em uma pequena cidade do interior de Minas. Muitas delas estavam ligadas à emoção de descer: carrinho de rolimã, saltos de um barranco onde uma estrada estava sendo construída, correnteza do rio “Zé Pedro”, descida em barranco sobre um papelão, descida do pasto de ‘capim-gordura’ em uma ‘canoa de coqueiro’… Confesso que a maioria destas aventuras era fruto muito mais de uma pressão da ‘tribo’ do que do desejo de experimentar a sensação de estar despencando de um local seguro para a incerteza de uma chegada em segurança.
Se você vai a um parque de diversões, pode perceber que os brinquedos que fazem mais sucesso são os que são marcados por serem brinquedos que prometem fortes emoções. A maioria deles conta com subidas lentas e descidas radicais. Quando ‘despencamos’ destes brinquedos, parece que nosso cérebro se junta ao estômago; ou melhor, parece que por dentro somos uma mistura total.
Quando olhamos para nossa vida, parece que nutrimos atração por “descidas radicais”, capazes de nos proporcionar momentos de muita excitação, prazer intenso (ainda que não muito duradouro), satisfação imediata. Sempre reclamamos da subida íngreme, mas nos deliciamos com as descidas velozes. Transportamos para a vida real o que sentimos nos parques, com as montanhas russas, os toboáguas. De maneira muito curiosa, as descidas exercem um poder de sedução enorme sobre o ser humano. Os perigos são colocados de lado diante da possibilidade de uma experiência capaz de tocar profundamente as emoções.
Às vezes, descer é sinônimo de grandeza; por exemplo: descer do orgulho, da altivez, da soberba indica grandeza de caráter. Em outras oportunidades, descer pode significar perder valores, negociar princípios importantes para uma vida sadia (não apenas a saúde do corpo, mas, sobretudo da alma, do espírito). Alguns exemplos poderiam ser citados, mas me valerei de dois apenas neste momento: suborno e corrupção, drogas. Os subornadores e subornados, os corruptores e corrompidos estão tão alucinados com a possibilidade de prazer imediato, sensação de “vento na cara”, promovidos por uma descida vertiginosa. Os que foram vencidos pelas drogas, vivem em função de uma interminável descida.
O grande problema é não saber quando estamos descendo para aprimorar nossa vida e quando estamos despencando para nossa própria ruína. A Bíblia registra a história de uma jovem que não soube fazer esta distinção e despencou para a ruína (Gênesis 34). Diná era a única filha de Jacó/Israel. A família tinha chegado a uma terra nova. Certo dia Diná decidiu descer para conhecer as meninas da terra. Sua intenção era formar novas amizades, estabelecer novos relacionamentos. Qual o mal nisso? Nenhum! O que faltou a Diná? Prudência. “Desceu” sozinha, saiu para um local desconhecido sem proteção. Enquanto passeava pela nova terra, Diná despertou a atenção, o interesse e a paixão de um príncipe daquele lugar. Logo no primeiro encontro ele teve relações sexuais com a moça (hoje isso é tão comum que até posso ouvir alguns dizendo que sou retrógrado e demasiadamente conservador). Isto foi motivo de vergonha e uma ofensa enorme para a família de Israel.
Os resultados de uma atitude “inocente” de Diná foram desastrosos: os irmãos, furiosos, armaram um plano de vingança: propuseram ao príncipe que convencesse a todos os homens da terra a se deixarem circuncidar. Esta era a condição para que a irmã fosse dada como esposa. Trato feito e cumprido por Siquém. Com todos os homens da terra recém-operados, entraram na casa do “cunhado”, tomaram a irmã de volta e promoveram uma enorme matança entre o povo. Isto gerou uma revolta enorme contra Israel e toda sua casa. Por causa disto tiveram que se mudar uma vez mais.
A questão aqui não é discutir se Diná e sua família era ou não melhor do que Siquém e seu povo. O fato é que, a despeito de ser um príncipe, Siquém cometeu um desatino entre a família de Israel. Isso, entretanto, não justificaria a atitude dos irmãos de Diná, que foi prontamente condenada por Israel.
Fico refletindo sobre o quanto agimos como Diná na nossa vida diária. Decidimos sair sozinhos para conhecermos as “meninas” da terra sem nos darmos conta de que há muitos “príncipes” à espreita para seduzir e violar. Este é um exemplo de uma descida para a ruína. O que motivou Levi e Simeão (irmãos de Diná) a repararem o desatino provocado por Siquém da maneira que julgavam ser a mais “justa” foi a convicção de que nenhum conforto de qualquer palácio dos príncipes desta terra é capaz de cobrir a vergonha de uma violação.
Diná saiu, desceu e despencou. Despencaram com ela Siquém, seus conterrâneos, além de Simeão e Levi, seus próprios irmãos. A perda foi irreparável.
Podemos aprender algo com esta história: por mais emocionante, intensa, prazerosa e radical que seja uma descida, é preciso ter certeza de que não se trata de um mero capricho ou desejo de satisfação pessoal, à custa dos valores de Deus.
Há um ditado popular que diz: “para baixo todo santo ajuda”. Isto é uma verdade. Para descer não é necessário nenhum esforço. O problema é a subida. Será que para ‘cima’ todo santo ajuda também? Será que “São Simeão” e “São Levi” ajudaram Diná a subir de volta? Não! Definitivamente não! Sabe por quê? Porque para cima só existe um santo que ajuda.
Caso você tenha despencado, a exemplo de Diná, recorra a este único santo capaz de trazê-lo de volta. Seu nome: Jesus Cristo.
Gidiel Câmara
Num mundo e num tempo onde muitos "líderes" (me recuso a chamar esses caras de pastores) dão um empurrão pra baixo na vida dos seus clientes, ops.. "fiéis", é revigorante ler um texto assim.
ResponderExcluirPor mais dura, árdua, espinhosa, apertada e íngreme que seja a subida, com toda a certeza, vale a pena! Ainda mais que tem um Grande nos dando força e nos puxando lá de cima.. É só por graça mesmo !
Belo texto rapaz !
Isso aí Arthur.
ResponderExcluirÉ importante entender que no Reino de Deus os que despencaram, independente do motivo, não ficarão no fundo do abismo.
Importante saber também que a GRAÇA não nos livra da árdua caminhada "morro acima".
Graças a Deus por Jesus, que desceu até onde estávamos para nos levar até onde ele está.
Valeu pelo comentário.
A grande dificuldade para ajudarmos as pessoas que caem, ou que estão desabando, é que teremos que parar e olhar para baixo para poder estender a mão, e como normalmente impunsionado pelo nosso nariz empinado, movido por nossa soberba e orugulho, onde sempre somos os donos da razão, só olhamos para frente e para cima, esquecemos que ele se fez caído, maldito,pobre,desemparado tudo para erguer o caido, para poder estar com o abatido e ajudá-lo.Quero ser como ele, ta difícil, mas continuo caminhando.
ResponderExcluirNão desista, caro amigo anônimo (digo, Baiano - rs).
ResponderExcluirEstender a mão deve ser um ato natural e contínuo de todo discípulo de Cristo.
Valeu pelo comentário.
Fala, meu amigo Gidiel!
ResponderExcluirSeus textos são sempre muito edificantes. Fico feliz que tenha voltado a postar com frequência!
Verdades Eternas em uma linguagem jovem e acessível, livre de jargões pesados e incompreensíveis!!!
Parabéns!
Minha oração é que o Senhor Deus continue usando a sua vida para a Glória e Honra D'Ele!
Abração!
Grande Alexandre!
ResponderExcluirPara mim, escrever é sempre um exercício espiritual. Meu desejo é que, de alguma forma, consiga transmitir um pouco do tanto que sou grato a Deus por tudo que Ele fez, tem feito, e certamente continuará a fazer por mim.
Obrigado pelas palavras.