sexta-feira, abril 22, 2011

Para baixo todo "santo" ajuda


Por que será que as descidas normalmente são muito mais desejadas do que as subidas? Uma resposta óbvia seria: a lei do menor esforço; ou seja, descer é sempre muito mais fácil e demanda menos esforço do que subir. Mas, há também uma outra explicação para a fascinação que a descida exerce sobre o ser humano: o prazer provocado pela sensação de “vento na cara” (isto tem a ver com velocidade, com precipitação, com ‘injeção’ de adrenalina na corrente sanguínea).
Lembro-me de muitas brincadeiras da minha infância, passada em uma pequena cidade do interior de Minas. Muitas delas estavam ligadas à emoção de descer: carrinho de rolimã, saltos de um barranco onde uma estrada estava sendo construída, correnteza do rio “Zé Pedro”, descida em barranco sobre um papelão, descida do pasto de ‘capim-gordura’ em uma ‘canoa de coqueiro’… Confesso que a maioria destas aventuras era fruto muito mais de uma pressão da ‘tribo’ do que do desejo de experimentar a sensação de estar despencando de um local seguro para a incerteza de uma chegada em segurança.
Se você vai a um parque de diversões, pode perceber que os brinquedos que fazem mais sucesso são os que são marcados por serem brinquedos que prometem fortes emoções. A maioria deles conta com subidas lentas e descidas radicais. Quando ‘despencamos’ destes brinquedos, parece que nosso cérebro se junta ao estômago; ou melhor, parece que por dentro somos uma mistura total.

Quando olhamos para nossa vida, parece que nutrimos atração por “descidas radicais”, capazes de nos proporcionar momentos de muita excitação, prazer intenso (ainda que não muito duradouro), satisfação imediata. Sempre reclamamos da subida íngreme, mas nos deliciamos com as descidas velozes. Transportamos para a vida real o que sentimos nos parques, com as montanhas russas, os toboáguas. De maneira muito curiosa, as descidas exercem um poder de sedução enorme sobre o ser humano. Os perigos são colocados de lado diante da possibilidade de uma experiência capaz de tocar profundamente as emoções.
Às vezes, descer é sinônimo de grandeza; por exemplo: descer do orgulho, da altivez, da soberba indica grandeza de caráter. Em outras oportunidades, descer pode significar perder valores, negociar princípios importantes para uma vida sadia (não apenas a saúde do corpo, mas, sobretudo da alma, do espírito). Alguns exemplos poderiam ser citados, mas me valerei de dois apenas neste momento: suborno e corrupção, drogas. Os subornadores e subornados, os corruptores e corrompidos estão tão alucinados com a possibilidade de prazer imediato, sensação de “vento na cara”, promovidos por uma descida vertiginosa. Os que foram vencidos pelas drogas, vivem em função de uma interminável descida.
O grande problema é não saber quando estamos descendo para aprimorar nossa vida e quando estamos despencando para nossa própria ruína. A Bíblia registra a história de uma jovem que não soube fazer esta distinção e despencou para a ruína (Gênesis 34). Diná era a única filha de Jacó/Israel. A família tinha chegado a uma terra nova. Certo dia Diná decidiu descer para conhecer as meninas da terra. Sua intenção era formar novas amizades, estabelecer novos relacionamentos. Qual o mal nisso? Nenhum! O que faltou a Diná? Prudência. “Desceu” sozinha, saiu para um local desconhecido sem proteção. Enquanto passeava pela nova terra, Diná despertou a atenção, o interesse e a paixão de um príncipe daquele lugar. Logo no primeiro encontro ele teve relações sexuais com a moça (hoje isso é tão comum que até posso ouvir alguns dizendo que sou retrógrado e demasiadamente conservador). Isto foi motivo de vergonha e uma ofensa enorme para a família de Israel.
Os resultados de uma atitude “inocente” de Diná foram desastrosos: os irmãos, furiosos, armaram um plano de vingança: propuseram ao príncipe que convencesse a todos os homens da terra a se deixarem circuncidar. Esta era a condição para que a irmã fosse dada como esposa. Trato feito e cumprido por Siquém. Com todos os homens da terra recém-operados, entraram na casa do “cunhado”, tomaram a irmã de volta e promoveram uma enorme matança entre o povo. Isto gerou uma revolta enorme contra Israel e toda sua casa. Por causa disto tiveram que se mudar uma vez mais.
A questão aqui não é discutir se Diná e sua família era ou não melhor do que Siquém e seu povo. O fato é que, a despeito de ser um príncipe, Siquém cometeu um desatino entre a família de Israel. Isso, entretanto, não justificaria a atitude dos irmãos de Diná, que foi prontamente condenada por Israel.
Fico refletindo sobre o quanto agimos como Diná na nossa vida diária. Decidimos sair sozinhos para conhecermos as “meninas” da terra sem nos darmos conta de que há muitos “príncipes” à espreita para seduzir e violar. Este é um exemplo de uma descida para a ruína. O que motivou Levi e Simeão (irmãos de Diná) a repararem o desatino provocado por Siquém da maneira que julgavam ser a mais “justa” foi a convicção de que nenhum conforto de qualquer palácio dos príncipes desta terra é capaz de cobrir a vergonha de uma violação.
Diná saiu, desceu e despencou. Despencaram com ela Siquém, seus conterrâneos, além de Simeão e Levi, seus próprios irmãos. A perda foi irreparável.
Podemos aprender algo com esta história: por mais emocionante, intensa, prazerosa e radical que seja uma descida, é preciso ter certeza de que não se trata de um mero capricho ou desejo de satisfação pessoal, à custa dos valores de Deus.
Há um ditado popular que diz: “para baixo todo santo ajuda”. Isto é uma verdade. Para descer não é necessário nenhum esforço. O problema é a subida. Será que para ‘cima’ todo santo ajuda também? Será que “São Simeão” e “São Levi” ajudaram Diná a subir de volta? Não! Definitivamente não! Sabe por quê? Porque para cima só existe um santo que ajuda.
Caso você tenha despencado, a exemplo de Diná, recorra a este único santo capaz de trazê-lo de volta. Seu nome: Jesus Cristo.


Gidiel Câmara

sexta-feira, abril 15, 2011

Nem réu, nem juiz; seja você mesmo

Desde nosso nascimento começamos a nos acostumar com muitas coisas que são inerentes a “este mundo”. Por mais amparada e protegida que uma criança seja, os “costumes deste mundo” não tardarão a se manifestar nela. Dos pais ela herdou aquilo que chamamos na teologia de “semente de Adão”, ou seja, sua alma já nasceu tatuada com a marca da queda. Portanto, podemos afirmar que, a despeito do aprendizado maior ser pelo exemplo, há nesta criança uma tendência em pender para as ações contrárias àquelas que Seu Criador (o Senhor Deus) espera ver nela.
Dentre tantas ações “negativas” que uma pessoa desenvolve no decorrer de sua existência destacaria neste momento a hipocrisia. Este vocábulo significa o esforço que alguém faz por aparecer como bom sem o ser verdadeiramente. Bem no início a criança pode desenvolver a hipocrisia como uma ferramenta para se defender. Isso, entretanto, não legitima suas atitudes hipócritas, e não torna a hipocrisia uma virtude.
Imagino que você já tenha se portado de maneira hipócrita tentando parecer o que não era (e, às vezes, nem desejaria ser) apenas para fugir de um dedo em riste apontado diretamente para você. Estou certo que você consegue me entender, afinal, além de termos a alma tatuada com a marca da queda, vivemos em um mundo marcado por infindáveis julgamentos. O medo de um julgamento faz com que as pessoas convivam com a hipocrisia. O que não pode deixar de ser dito é que tanto os julgadores, como os verdugos também são vítimas da hipocrisia.
Diante deste fato, de um mundo revestido por um manto hipócrita, é absolutamente libertador o fato de sermos “desmascarados”. Quando nos acham sob o manto da hipocrisia, por mais humilhação que isto possa provocar, no fundo, isto implica em uma grande libertação. Somos libertos do medo, da falsidade, da teatralidade, da superficialidade, da inútil tentativa de viver para agradar os outros (que é muito diferente de viver para os outros). Somos libertados da prisão que eu chamaria de “o que vão pensar de mim” para a realidade de uma poderosa transformação interior: somos transportados da dimensão regida pelo desejo de sermos quem os outros desejam, para a dimensão que nos permite ser quem o Criador espera que sejamos.
Parece fácil, mas não é. Se assim o fosse, o mundo não estaria do jeito que está. Sem esta transformação (oferecida gratuitamente por Jesus Cristo) entramos num ciclo que nos leva de vítimas a algozes, ou seja, de julgados e condenados passamos a sermos juízes dos outros. De maneira muito infeliz somos mais implacáveis e inclementes com os que cometem o mesmo tipo de “delito” cometido por nós mesmos (mas mantido em sigilo, acobertados por grossas camadas de hipocrisia). Enquanto outros são acusados, condenados, humilhados e torturados, continuamos no ‘anonimato’. Por isso, antes de sermos libertados deste cárcere, por intermédio da graça de Cristo, não nos assustamos com a “desgraça” dos outros (repito: para mim isso é graça e não des-graça), ao contrário, sentimos uma terrível sensação de prazer. Por que você acha que a imprensa sensacionalista rende tanto?
A Bíblia registra uma história, no capítulo 38 do livro de Gênesis, que nos serve de ilustração com relação a este assunto. Judá, um dos filhos de Jacó, tomou uma mulher em casamento e teve filhos com ela. Crescidos os jovens, um deles, Er, se casou com uma moça chamada Tamar. Er era perverso perante o Senhor, e por isso morreu ainda jovem. A cultura da época dizia que se um jovem morresse sem deixar descendência, o irmão deveria tomar a cunhada por esposa, para que o morto não ficasse sem descendência. Por isso, Onã, teve que se casar com Tamar. Este também era perverso e se recusou cumprir o “levirato”, pelo que também acabou morrendo. Judá tinha ainda outro filho bem mais jovem, não podendo exercitar o Levirato. Tamar, então, voltou para casa dos seus pais a fim de esperar que Selá tivesse idade suficiente para se casar com ela. O tempo passou, Selá cresceu e Tamar foi esquecida por todos, inclusive por seu sogro.
Alguns anos mais tarde Judá ficou viúvo. Certo dia saiu com um amigo para ver a tosquia de suas ovelhas. Informada disso, Tamar disfarçou-se e Judá, julgando ser ela uma “garota de programa” teve uma relação sexual com ela. O “preço” combinado foi um dos cordeiros do rebanho, mas antes disso Tamar exigiu um penhor: o selo, o cordão e o cajado de Judá. Tudo acertado, Judá seguiu seu caminho e Tamar se despiu de seu disfarce.
Tempos depois Judá foi informado que Tamar, sua nora, estava grávida. Imediatamente ordenou que a mulher fosse levada à presença de todos para que fosse morta (assim era tratado o adultério naquele tempo). Antes de ser levada, entretanto, ela pediu que perguntassem ao seu sogro se reconhecia aquele “selo, cordão e cajado”.
O desfecho da história foi outro. O julgador foi desmascarado. Diria mesmo que ele foi liberto do posto de ‘juiz’ e pôde ser ele mesmo, um homem, um ser humano, igual a Tamar, passível de erro, de deslizes, de falhas, de cometer pecados. Enquanto estava julgando outra pessoa por um erro “imperdoável” deixou de olhar para si mesmo sendo, desta forma, impedido de reconhecer os seus próprios desvios e pecados. No caso, a injustiça para com a própria Tamar – Selá já havia crescido e Judá não o casara com ela.
Judá percebeu que Tamar era mais justa que ele. Que bênção para ele! Seu selo, cordão e cajado foram encontrados. Uma aparente humilhação diante dos amigos sobre os quais ele tinha certa influência. Digo ‘aparente’ porque na realidade foi uma tremenda libertação: conheceu uma terceira via – ser ele mesmo (antes conhecia apenas duas: ser vítima ou algoz; réu ou juiz).
Talvez você, que lê este artigo, conheça também apenas estas duas vias e viva pulando de uma para outra: ora é vítima, ora é algoz; ora é réu, ora é juiz. A boa notícia para você é que Jesus quer apresentar-lhe uma terceira via: a sinceridade; você ser “você” sem medo de ser julgado, humilhado, hostilizado e condenado. Ele disse: “Venham a mim, todos os que estão cansados e sobrecarregados, e eu lhes darei descanso. Tomem sobre vocês o meu jugo e aprendam de mim, pois sou manso e humilde de coração, e vocês encontrarão descanso para as suas almas” (Mateus 11:28,29).
Você é um abençoado se seu “selo, cordão e cajado” forem descobertos. Os momentos de humilhação serão transformados em momentos de glória.
Infeliz é você, se imagina que julgando os outros por cada deslize deles conseguirá manter escondidos seu “selo, cordão e, cajado”. Aliás, uma pergunta se faz pertinente neste momento: você sabe onde eles estão?

Gidiel Câmara