quinta-feira, outubro 21, 2010

Um "morto-de-fome"

Por vezes os conceitos que temos da vida e das pessoas não correspondem à realidade. Confundimos humildade com pobreza, por exemplo. Quando nos referimos a alguém desprovido de recursos financeiros dizemos que se trata de uma pessoa humilde. Entretanto, esta nem sempre é a realidade dos fatos. Conheço gente pobre que, a despeito disto, é dominada pela avareza, soberba e orgulho. Por outro lado, conheço pessoas abastadas financeiramente demonstrando humildade em suas atitudes. Confundimos também ‘casa’ com ‘lar’. Uma casa nem sempre abriga um lar. Há palacetes que não são dignos de serem chamados de lar, ao passo que existem barracos que são verdadeiros ‘ninhos’ nos quais os ‘filhotes’ não são apenas alimentados, como também protegidos, ensinados, educados e treinados para enfrentarem com dignidade a vida.

De fato, temos a tendência de emitir um parecer muito mais pelo que vemos do que pelo que conhecemos. A aparência exterior normalmente nos impressiona, mas creio também que ela nos engana com uma frequência maior do que gostaríamos. Somos mais bem tratados quando estamos mais “bem vestidos” do que quando estamos usando “roupas de pobre”. Somos medidos pelo que temos e não pelo que somos. Alegra-me muito conhecer a verdade que diz que o Eterno, o Senhor do Universo não usa este mesmo critério para nos medir. Sendo assim, posso ser o que sou, ainda que seja menos, quando medido pela “régua da terra”.

Outro dia andava pela cidade onde moro e fui percebendo a mudança na paisagem de pedra. À medida que atravessava de um lado para o outro da cidade o nível social foi “subindo”. A sensação era de que estava entrando em um mundo ao qual não pertencia. No entanto, literalmente no meio da prosperidade há uma enorme favela incrustada. Fiquei pensando se esta não seria uma dádiva dos céus para os moradores daquela parte da cidade, a fim de que nunca se esqueçam de que a vida não é apenas “cor-de-rosa”.

Numa reflexão mais acurada me pergunto: “onde realmente está a pobreza? No bolso furado ou na alma vazia? Onde a fome provoca maiores danos: no estômago ou no espírito?” É fato que a saciedade, a satisfação não anda de mãos dadas com a prosperidade. Um dos grandes problemas do ser humano é não reconhecer a natureza da verdadeira pobreza e da verdadeira fome. O caminho escorregadio da confiança em coisas, em bens, tem levado milhares ao abismo eterno. Uma pessoa que não tenha a consciência de que o ser humano é mais do que matéria, mais do que corpo, mais do que ‘carne’, pode facilmente se confundir no momento de se ‘alimentar’. O risco de ser regido pelos desejos é maior do que o imaginado. O prejuízo, nesse caso, é grande e iminente.

A Bíblia narra, no livro de Gênesis (capítulos 25, 27, 28, 33), a história de Esaú. Este moço era filho de Isaque com Rebeca. Fruto de uma gestação de gêmeos foi o primeiro a nascer. A cultura de sua época reservava para ele o melhor da herança e da bênção do seu pai. Esaú saiu-se perito caçador; era um homem do campo, um tanto rude, ao passo que seu irmão, Jacó, era mais pacato, mais apegado à mãe e com preferências bem diferentes das de seu irmão. Em um fim de tarde, quando os dois já eram rapazes, Esaú voltava de sua labuta na terra e encontrou Jacó terminando de fazer uma apetitosa comida. Olhou para aquela delícia e disse ao irmão: “dê-me um pouco desta maravilha”. Jacó lhe respondeu: “somente se você aceitar em dar-me em troca o seu direito de irmão mais velho”.

Esta parece ter sido uma cena comum, trivial, corriqueira de uma família normal. Mas não é. Este episódio é uma figura do que tem acontecido por milênios na história da humanidade. E eu explico a razão. Assim como Esaú, centenas de milhares de pessoas são dominadas pelas necessidades urgentes, ainda que elas sejam as necessidades básicas para a sobrevivência. Em momentos assim sempre tem surgido um “Jacó” para oferecer uma solução para aquela situação. O problema é que os “Jacós” não estão interessados em ajudar pelo simples prazer de ver o necessitado atendido e satisfeito. Há um interesse em uma barganha desleal na qual apenas eles, os “Jacós”, serão beneficiados. Os “Esaús” terão suas necessidades temporais atendidas ao custo de um prejuízo duradouro (eterno, em muitos casos).

Não creio que tenha sido uma coincidência aquela cena. Imagino que Jacó tenha preparado aquela armadilha para seu irmão. A refeição devia ser uma das preferidas de Esaú. A “isca” era realmente muito atraente. Basta ver a resposta que Esaú deu à proposta de Jacó sobre a venda do seu direito de irmão mais velho: “Estou quase morrendo. De que me vale esse direito?”. Percebe que este “morto-de-fome” trocou o permanente pelo passageiro, o duradouro pelo efêmero? Pensou com o estômago e não com a cabeça.

Pense comigo: Não tem sido esta a realidade com a qual eu e você lidamos diariamente?! Pessoas “mortas-de-fome” têm trocando seus direitos, seus valores, sua dignidades, seus princípios corretos, sua honra, seu caráter por um prato de uma suculenta refeição. Refeição esta com aromas ‘irresistíveis’, muito bem elaborada por aquele que quer tirar do ser humano o seu ‘direito de filho mais velho’. O resultado tem sido, para muitos, o mesmo experimentado por Esaú, que ficou sem a bênção do pai e sem os privilégios de filho mais velho. Posteriormente buscou a bênção, mas ela fugiu dele.

Os “Esaús” que estão cansados de ser enganados pelos “Jacós” da existência precisam conhecer Aquele que é poderoso para saciar as necessidades mais profundas do ser humano. O Senhor Jesus Cristo é o “Pão que desceu do céu” para matar a fome da alma. Se Esaú tivesse a alma saciada, não trocaria seu direito de irmão mais velho por uma refeição, mesmo se fosse sua refeição preferida.

Esteja certo que suas refeições preferidas lhe serão oferecidas com o fim de receber o seu ‘direito de irmão mais velho’. A questão decisiva é a seguinte: você é um “morto-de-fome”, ou alguém que, a despeito de estar faminto, conhece o “caminho do fogão”?


Gidiel Câmara

2 comentários:

  1. É mano, gostei !

    É interessante notar que sempre somos mais tentados nas áreas que temos mais fraquezas. Uns, como Esaú, são pegos pelo estômago. Outros pela carteira, outros ainda pela luxúria.

    Os atalhos são tão fáceis, o caminho é bem asfaltado, largo, fácil mesmo de seguir. Pra um morto-de-fome, é realmente um "prato cheio".
    Já o caminho do fogão, é bem duro, cheio de pedregulhos, tem momentos bem íngremes, mas vale o esforço. Esse caminho de santidade vale a pena.

    De fato, é fundamental vivermos na presença de Deus, e vivermos a presença de Deus em nossas vidas. Davi expressa isso muito bem no Salmo 23.1-3a: "O SENHOR é o meu pastor; nada me faltará. Ele me faz repousar em pastos verdejantes. Leva-me para junto das águas de descanso; refrigera-me a alma."
    A presença de Deus nos dá saciedade, satisfação, prazer sem comparação!
    Pra não ser um morto-de-fome basta uma vida na presença do Pai, um Pai amoroso que cuida maravilhosamente bem dos Seus filhos.

    Very Good Pastor !!

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  2. Pois é Arthur, a Bíblia diz que a porta para a saciedade insana é larga enquanto que o "caminho do fogão" é estreito.
    Louvo a Deus por ter me conduzido e estar me conduzindo diariamente, através de Jesus, pelo caminho estreito.

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