segunda-feira, maio 31, 2010

Caim ou Abel – quem foi maior vítima?

Temos sempre a tendência de considerarmos como maiores vítimas as pessoas que são agredidas, feridas, torturadas, violentadas, exiladas, caluniadas, discriminadas… Isso é devido à forma como fomos treinados para enxergar a vida . Se alguém sofre, logo é alvo da nossa “compaixão”. Se bem que não sei se deveria usar este termo, pois o que sentimos não é bem isso, uma vez que compaixão sempre nos leva a uma atitude. Na verdade o que sentimos é algo que nos emociona, mas passa logo que a cena some do alcance da nossa visão, e logo podemos suspirar aliviados: ufa!

Mas gostaria de convidá-lo a refletir sobre uma questão a respeito deste tema. É fato que existem casos nos quais as maiores e piores vítimas são os agressores, os algozes, os protagonistas das grandes atrocidades. Eles também deveriam ser alvos da nossa compaixão e não do nosso ódio. Pelo menos é isso que eu consigo entender do ensinamento das Sagradas Escrituras. Jesus nos ensinou que devemos amar os nossos inimigos (Mt. 5:44), orar pelos que nos perseguem (Mt. 5:44) e caminhar um quilômetro a mais quando nos obrigarem a andar apenas um (Mt. 5:41). Esse Jesus! Sempre andando na contra mão. Graças a Deus por isso!

Tenho visto que as maiores vítimas, na realidade, são aqueles que vitimam. Tomo como exemplo um episódio dos tempos bíblicos, ainda na gênese da humanidade (Gn. 4). Nesta história conhecida, o irmão mais velho se levantou traiçoeiramente contra o mais novo e o assassinou brutalmente (existe algum assassinato que não seja brutal? Tirar a vida de uma pessoa é sempre uma brutalidade sem igual). A maioria é levada a considerar Abel como a maior vítima nesta história. Mas, será que foi mesmo? Não para mim. Considero Caim a maior vítima desta história. A Bíblia se refere a Abel como sendo um justo, ao passo que a figura de Caim ficou para sempre manchada por sua atitude nefasta.

Caim foi vítima de si mesmo; vítima da sua inveja; vítima do seu orgulho; vítima do seu ciúme; vítima da sua revolta contra o Criador; vítima do seu ódio; vítima do medo de olhar para dentro de si mesmo e reconhecer sua necessidade de conserto, de reforma. Para mim ele foi a maior vítima desta história, pois teve que conviver para sempre com todos estes sentimentos não tratados, não resolvidos, não perdoados. Caim não prevaleceu contra Abel. Olhando para esta história, digo que preferiria perder como Abel, a prevalecer como Caim.

Jesus foi torturado, caluniado, humilhado e cruelmente assassinado. Quem foi a verdadeira vítima? José foi humilhado e vendido pelos irmãos; foi caluniado pela esposa de Potifar. Quem foi a verdadeira vítima? Estêvão foi apedrejado até a morte. Quem foi a verdadeira vítima? John Huss foi queimado vivo na época dos pré-reformadores. Quem foi a verdadeira vítima? Martin Luther King foi assassinado por causa de sua luta por igualdade racial nos Estados Unidos. Quem foi a verdadeira vítima?

Quando o apóstolo Paulo escreveu aos romanos, o tempo era de terrível adversidade para os cristãos: humilhação, perseguição, supressão da liberdade, confisco de bens, tortura e morte. Foi a estas pessoas que ele escreveu: “Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus” (Rm. 8:28). Mais uma vez somos levados a pensar que estes derrotados aqui (na terra) não eram vítimas lá (no céu).

Se você tem enfrentado tempos de calúnia; se já lançaram na lama o seu nome e sua reputação; se seus sonhos estão sufocados pelo poder maligno de seus ‘inimigos’; se tripudiam sobre o seu ‘caixão’; se tentam tornar estéril a terra na qual Deus o plantou, sossegue o coração e a alma, pois as maiores vítimas são eles.

Abel prevaleceu sobre o ciúme, ódio e fúria do irmão. Sendo como Abel você também prevalecerá sobre os Cains que o convidam para o campo a fim de lhe assassinar, tentando matar aquilo que os mata: o seu brilho. Caminhando com o Eterno, você pode ser considerado vítima aqui (na terra), mas jamais será visto como vítima lá (no céu).

Nele,

Pastor Gidiel.

terça-feira, maio 25, 2010

Castigado ou Preservado?

Como é que temos encarado os reveses da vida? Como suportamos as aflições? Como enfrentamos os ‘vales de sombra da morte’? Tudo isto depende e muito da visão que temos de Deus. Muitos são os que acreditam que tudo que é ‘doce ao paladar’ vem de Deus, e tudo que não se encaixa dentro do nosso padrão de ‘tudo bem’, não procede dEle, afinal ele somente quer o nosso bem-estar.

Aí reside um grande problema: o bem-estar de Deus para seus filhos passa, na maior parte das vezes por desertos, por vales profundos, provações, decepções, perdas, fracassos. Por não entenderem isto, ou por não aceitarem isto, encaram os reveses como castigo de Deus, invariavelmente. Em virtude de um conceito desta natureza muitos privam-se das mais preciosas bênçãos do Criador.

Temos ouvido sobre Adão e como ele foi “castigado” por Deus. O castigo para muitos que conhecem esta história foi sua expulsão do jardim do Éden. Mas não vejo isto no relato no livro de Gênesis. A expulsão de Adão do Éden não foi um castigo, e sim uma enorme preservação. Veja as palavras do Senhor neste episódio: “Então disse o SENHOR Deus: Eis que o homem é como um de nós, sabendo o bem e o mal; ora, para que não estenda a sua mão, e tome também da árvore da vida, e coma e viva eternamente, O SENHOR Deus, pois, o lançou fora do jardim do Éden, para lavrar a terra de que fora tomado. E havendo lançado fora o homem, pôs querubins ao oriente do jardim do Éden, e uma espada inflamada que andava ao redor, para guardar o caminho da árvore da vida” (Gn. 3:22-24). Adão já tinha desobedecido a Deus e tomado do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, para preservá-lo o Senhor o tirou do jardim, para que ele não tomasse da árvore da vida e comesse.

A história de Adão nos ensina que aquilo que aos olhos do homem é castigo pode ser, aos olhos de Deus, um precioso livramento, uma maravilhosa preservação. Infelizmente esta não tem sido a concepção, até mesmo dentro da igreja.

Conheço a história de um irmão que foi ‘convidado a se retirar’ de sua igreja porque cometeu um delito aos olhos santos de uma liderança hipócrita. Alguns de seus amigos questionaram a decisão desta liderança, que prontamente respondeu: “irmãos, vejam bem o exemplo de Adão; ele pecou uma única vez e foi expulso do paraíso”. Neste caso esta liderança demonstrou que sua visão do episódio no Éden não se harmonizava com o que as Escrituras apresentam. Será que o irmão que foi ‘excomungado’ foi mesmo castigado ou ganhou de Deus o presente de uma preservação valiosa?! Será que em vez de castigo ele foi preservado de uma situação pior?!

Gostaria que você considerasse a possibilidade de um livramento sempre que estiver diante de uma situação na qual todos apontam como sendo um castigo de Deus. Aos seus filhos ele disciplina, e isto está patente nas Escrituras, mas a vertente da preservação é uma realidade que frequentemente é deixada de lado. Esta preservação por vezes passa por ‘terrenos’ que não são em harmonia com os desejos do nosso coração.

Adão, volto a afirmar, não foi castigado sendo sido expulso do Éden. Ali ele experimentou uma preciosa preservação.

Pastor Gidiel

segunda-feira, maio 24, 2010

O sexo triste dos Jovens

Procuro ser aberta ao novo, ao que me agrada no novo e também ao que exige um certo tempo para ser assimilado. Às vezes há o que não vale a pena ser assimilado, então, vou buscar outras paisagens. Eventualmente não sabemos se vale ou não, então, a gente fica humilde e espera. Uma novidade (para mim) espantosa, narrada e confirmada em mais de um lugar no país, é dessas que não quero assimilar. Se possível, enterrava numa cova funda, varrida para baixo de mil tapetes, fazia de conta que não existia: o sexo (ou simulacro de sexo) sem encanto, sem afeto, sem tesão, o sexo triste ao qual são coagidos pré-adolescentes, quase crianças, em famílias de classe média e alta. Essas que pensamos estar menos expostas às crueldades da vida.
Talvez eles não precisem comer lixo, correr das balas dos bandidos, suportar brutalidades e incestos, tanto quanto os mais desvalidos. Seu mal vem sob outro pretexto: o de ser moderno e livre, ser aceito numa tribo, causar admiração ou inveja.
Cresce, que eu saiba, o número de meninas de 12 a 14 anos grávidas. O impensável ocorre muitas vezes em festinhas nas quais se servem bebidas alcoólicas (que elas tomam, ou pagariam mico diante das amigas, e com essa desculpa convencem os pais confusos), não há nenhum adulto por perto (seria outro mico, e assim elas chantageiam os pais omissos), e ninguém imaginaria o que ia rolar.
Nessas ocasiões pode rolar coisa assombrosa sob o signo da falta de informação, autoridade e ação paternas. Nem sempre, mas acontece. Crianças bêbadas no chão do banheiro de clubes chiques, adultos cuidando para não sujar o sapato no vômito não são novidade (ambulância na porta, porque algumas dessas meninas ou meninos passam mal de verdade); quantas meninas consigo beijar na boca numa festinha dessas? Em quantos meninos consigo fazer sexo oral? Sexo que vai congelando as emoções ou traz uma doença venérea, quem sabe uma absurda gravidez - interrompida num aborto, de sérias consequências nessa idade, ou mantida numa criança que vai parir outra criança.
“Roubaram a sexualidade desses meninos”, me diz uma experiente terapeuta. Não deixaram tesão nem emoção, mas uma espécie de agoniado espanto, nessas criaturas ínexperientes que descobrem seu corpo da pior maneira, ou aprendem a ignorá-lo, estimuladas ou coagidas por incredulidade ou fragilidade familiar, pelo bombardeio de temas escatológicos que nos assola na TV e na internet, com cenas grotescas, gracejos grosseiros em torno do assunto – “valores” e “pudor”; palavras hoje tão arcaicas. Efeito da pressão de uma sociedade imbecilizada pela ordem geral de que ser moderno é liberar-se cada vez mais, sem saber que dessa forma mais nos aprisionamos. Precisamos estar na crista da onda em tudo, tão longe ainda da nossa vida adulta: sendo as mais gostosas e os mais espertos, desprezando os professores e iludindo os pais, sendo melancolicamente precoces em algumas coisas e tão infantilizados e ignorantes em outras, nisso incluindo nosso próprio corpo, emoções, saúde e vitalidade.
A nós, adultos, cabe não desviar os olhos, mas trabalhar na esperança (caso a tenhamos) de que nossos adolescentezinhos, às vezes ainda crianças, vivam de maneira natural essa delicada fase, e um dia conheçam o sexo com ternura, na tesão de sua idade - forte e boa, imprevista e imprevisível, com seu grão de medo e perigo, beleza e segredo. Que essas criaturínhas sejam mais informadas e mais conscientes do que, muito mais protegidas que elas, nós éramos. Mas seguras e saudáveis, não precisando lesar sua bela e complexa intimidade com tamanha violência mascarada de liberdade ou brincadeira. Sobretudo, sem serem estimuladas a lidar de modo tão insensato com algo que pode lhes causar traumas profundos, ou anular um aspecto muito rico de sua vida. É difícil, mas a gente precisaria inventar um movimento consciente, cuidadoso, responsável, contra essa onda sombria que quer transformar nossas crianças em duendes pornográficos, deixando feias cicatrizes, e fechando-lhes boa parte do caminho do crescimento e do aprendizado amoroso.



Lya Luft

Veja - 26 de Maio, 2010